O
primeiro telefonema durou vinte e um minutos e vinte e nove segundos. O
segundo, durou cinquenta e oito minutos e quarenta e oito segundos. Isso porque
adquiri uma nova linha de celular, na condição de dependência da minha linha
principal, para poder trocar o aparelho gratuitamente. Conforme o atendente da
loja informou, se eu contratasse uma nova linha (outro chip), o aparelho que
custa mais de mil reais sairia gratuitamente. O chip novo custaria por volta de
cinquenta reais e eu teria obrigação de ficar com ele apenas um mês, podendo
cancelar, se assim desejasse. E foi o que eu fiz.
Durante
a primeira ligação, a atendente Priscila, perguntou qual o motivo do
cancelamento. Respondi apenas que não quero mais. Foi tudo muito fácil. Ela
começou a providenciar o cancelamento e a linha caiu. Foi aí que eu percebi que
estava tudo bom demais.
A
terrível sensação de ser um prisioneiro de uma chamada telefônica tomou conta
de mim, causando ânsia de vômito e pânico. Eu estava tremendo quando ousei
ligar de novo.
A
segunda ligação foi traumática. O atendente Daniel, mesmo de posse do número de
protocolo que me foi informado na primeira ligação, me fez repetir tudo de
novo: data de nascimento, CPF, motivo do telefonema, motivo do cancelamento,
meu nome, confirmação do número sobre o qual eu queria falar... enfim, tudo o
que já havia sido perguntado na primeira vez e que deveria, pela lógica, estar
arquivado no sistema. Eu não sei, mas a minha lógica diz que o número de
protocolo deve servir justamente para evitar a repetição de informações
fornecidas previamente. Mas a lógica do telemarketing é outra. A lógica do
telemarketing é a seguinte: em casos de cancelamento, faça o cliente desistir.
Diante
de várias informações que não faziam sentido, Daniel tentava me manter com a
segunda linha. Eu tentei explicar, muitas vezes, que por mais barato que fosse,
não fazia sentido pagar por algo que eu não uso. Ele ainda tentava argumentar,
com a destreza que só esse tipo de profissional tem.
—
Senhor, a operadora reconhece que o senhor é um ótimo cliente. Por isso,
preciso te dar algumas informações sobre essa linha adicional...
— Eu quero cancelar! — retruquei
abruptamente. Ele não se intimidou:
— Senhor, eu estou te passando
informações e o senhor se recusa a ouvir...
— Eu quero cancelar! Você, por acaso,
está querendo dificultar o cancelamento? — perguntei, sabendo que a ligação
estava sendo gravada.
— De forma nenhuma, senhor. Mas preciso
passar informações antes de proceder. Ele se recusou a entender que todas essas
informações já haviam sido passadas na chamada anterior. E continuou:
— Pense no caso de algum familiar que
pode usufruir dos mesmos benefícios que o senhor tem na linha principal...
— Amigo, eu não tenho família. Sou sozinho
no mundo. Morreram todos, meu pai, minha mãe, meus filhos, mulher, todos foram
enterrados já! — Me perdoem os politicamente corretos, mas não me contive. Eu
realmente precisava dar um drama para ver se ele terminava logo aquilo tudo.
Mas atendentes de telemarketing são desprovidos de bom senso. Verificando em seu sistema que a informação
fúnebre era completamente falsa, fato que ele deduziu apenas por perceber que
eu tenho uma linha de telefone fixo (o que me fez acreditar, por poucos
segundos que eu estava conversando com o Sherlock Holmes da telefonia celular
brasileira), ele continuou sua argumentação, para provar que era super
vantajoso pagar quase vinte reais por mês por um serviço que eu não utilizaria.
E então, a série de descontos começou. De cinco em cinco, consegui, sem querer,
30% na linha adicional.
Mas eu sou forte. Se ele é o Sherlock
Holmes, eu sou o Wolverine.
— Quero cancelar. Verifique aí no seu
sistema quantas vezes eu fiz uso da linha adicional.
— Senhor, essa é a primeira coisa que
nós vemos...
— Então me fale quantas vezes eu usei —
desafiei.
— Mas senhor, é de extrema vantagem... —
interrompi antes que ele conseguisse terminar de pronunciar “vantagem”:
— Eu perguntei quantas vezes eu usei!
Depois de mais alguns minutos
discutindo, brigando por algo que é um direito meu e que não deveria ser tão
difícil conseguir, depois de mais argumentações, nas quais ele insistia em
dizer todos os descontos que eu teria (e que ainda assim seriam mais caros do
que eu estou pagando, vejam só) e quando eu já planejava meu próximo argumento,
propondo que a operadora deveria então me dar a linha adicional com 100% de
desconto e ainda depositar vinte reais todo mês na minha conta no período de um
ano, ele se convenceu e deu prosseguimento ao meu pedido. Ainda tentou me
comover dizendo que eu não precisava penalizar o atendente (ele). Não deu
certo. Eu venci. Cancelei a linha adicional!
Atendente Daniel, me desculpe. Não há
nada pessoal, ok? Eu sei que a chatice faz parte do seu treinamento. Mas eu
consigo ser mais chato do que todos vocês juntos.
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